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Pesquisadores da Univali podem ter encontrado continente perdido no fundo do mar

Julimar Pivatto
julimar.pivatto@osoldiario.com.br


Depois de 25 dias a bordo de um navio, sem televisão e com acesso muito restrito à internet, os dois pesquisadores da Univali que participaram da expedição Iata-Piúna aos poucos tentam voltar à rotina em terra-firme. O tempo vem se dividindo entre entrevistas, descanso com a família e, claro, muito trabalho. Mas boa parte das horas são para satisfazer a curiosidade, principalmente, de alunos e colegas, interessados em saber o que eles viram nas profundezas do Oceano Atlântico.

José Angel Alvarez Perez, coordenador do grupo de estudos pesqueiros, e André Oliveira de Souza Lima, coordenador do grupo de pesquisa em genética molecular aplicada, também são professores do curso de Oceanografia da Univali e relataram as primeiras impressões do que foi visto. Ainda é cedo para divulgar os resultados da pesquisa, mas é bem possível que eles tenham encontrado o que seriam os restos de um continente.

— O pesquisador japonês que mergulhou na região apenas viu e filmou a região. Não foi possível coletar amostras, mas é bem possível que se trate de granito, e este é um tipo de rocha continental, que não se encontra no fundo do mar — explica Angel.

A principal hipótese levantada pelos pesquisadores é de que esta rocha era parte do antigo continente de Pangeia, época em que apenas um território existia na terra e que, com a separação, se dividiu em África/Europa e Américas.

— É grande a chance de que este continente perdido seja uma parte que se desprendeu durante a separação dos continentes que acabou afundando. Mas pode ser que seja algum material despejado por navio, o que seria uma coincidência.

Além disso, vários materiais foram coletados e boa parte deles virá para a Univali, onde os professores estudarão com os alunos. Mas por causa de um problema com a transportadora, eles devem chegar hoje ou amanhã. Os itens mais curiosos são os sedimentos coletados no fundo do mar, bactérias e duas espécies de polvo.

— Acredito que teremos grandes chances de descobrir espécies novas de bactérias, que é um organismo fundamental para a vida animal e vegetal que se encontra naquela profundidade — conta André.

Pesquisa é inédita na região do Atlântico Sul

Foi a primeira vez que um submersível, como o Shinkai 6500, de tecnologia japonesa, desceu nas regiões conhecidas como Elevação do Rio Grande e Dorsal do Atlântico, que ficam a cerca de 1 mil quilômetros da costa do Rio de Janeiro. A primeira região tem aproximadamente o tamanho do Estado da Bahia e foi o motivo de os cientistas da Univali terem sido convidados a participar da expedição, já que eles vinham estudando a área.

O submarino era acoplado ao navio Yokosuka e é um dos poucos do mundo a descer, com até três pessoas, a até 6 mil metros de profundidade. A pesquisa é resultado de um acordo entre os governos brasileiro e japonês, assinado em 1985. Ela foi financiada pelos japoneses com apoio de pesquisadores brasileiros.

O trajeto feito por José Angel Alvarez Perez e André Oliveira de Souza Lima partiu da Cidade do Cabo (África do Sul), dia 13 de abril e desceu na segunda-feira no Rio de Janeiro, quando houve troca na equipe de pesquisadores e a expedição continuou em outro trecho do Atlântico. Por isso, ainda não foram divulgadas fotos do fundo do mar, apenas um vídeo. Todo o material será repassado depois do término desta segunda viagem, que vai até o dia 27 de maio.

Os resultados obtidos vão alimentar o conjunto de informações já publicadas pelo grupo da Univali na área do projeto Mar-Eco Atlântico Sul, que têm atividades apoiadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc).

Mergulho para apenas um pesquisador

A previsão inicial era de que todos os pesquisadores fariam um mergulho. Eram dez a bordo, sendo cinco brasileiros e cinco japoneses. Mas apenas sete deles tiveram o privilégio de descer. Por isso, o professor da Univali, André Oliveira de Souza Lima, acabou ficando de fora. Um sentimento de frustração que, segundo ele, logo passou.

— No começo fiquei triste, mas já estou convivendo bem com isso. Quando eu comecei a perceber as amostras únicas e a qualidade com que elas chegaram até nós, percebi que estava em um projeto totalmente diferente e, só isso, já é motivo de orgulho — disse André.

O motivo da mudança de planos foi o mau tempo. Tanto que a previsão é de que o primeiro mergulho já seria o do professor José Angel Alvarez Perez, só que quando eles chegaram na região da Elevação do Rio Grande, havia muitas ondas e isso impediu que o submersível descesse.

Então, eles foram para a Dorsal de São Paulo e, depois, voltaram para a elevação, onde Angel fez o mergulho a 1,2 mil metros de profundidade, no chamado Jardim dos Corais. Foram oito horas dentro do submersível, dividindo um espaço de dois metros de diâmetro com os dois pilotos japoneses. Um teste e tanto para qualquer um.

— Fizemos um treinamento e um teste de estresse, para avaliar se teríamos condições de descer. Ficamos em um espaço reduzido, mas muito seguro. Quando a gente chega lá embaixo e vê toda aquela imensidão e a quantidade de material a ser pesquisado, a gente até esquece que está lá. Só pensa no trabalho — conta Angel.

Exploração comercial na região

Qual seria o interesse do governo brasileiro na região? A pergunta é uma das mais repetidas. Para os pesquisadores da Univali, é difícil mensurar o valor científico da expedição e, para eles, é o que mais interessa. Mas existe a possibilidade, hoje ainda remota, de se explorar comercialmente a Elevação do Rio Grande. Isso porque é grande a quantidade de minerais como cobalto, ferro e magnésio no fundo do mar.

Existe um tratado internacional que cada país é dono de uma área de até 200 milhas da costa (cerca de 321 quilômetros). Mas cada nação pode pedir uma revisão desta área e se ele estiver pesquisando a área, as chances são maiores. Aí, toda a coluna de água seria explorada pelo Brasil, não apenas para a retirada dos minerais, mas também para a pesca. Segundo José Angel Alvarez Perez, essa implicação política é normal e não deve atrapalhar a expedição.

— Primeiro teremos que confirmar se essa coluna de rocha é mesmo de um continente. Aí, ver para quem ele pertence é uma outra história — comenta o professor.

Para confirmar se realmente o que foi encontrado no fundo do mar é granito, um novo cruzeiro deve ser enviado pelo governo brasileiro, para usar um equipamento que perfure a rocha e traga amostras. Outro indício de que pode se tratar mesmo da rocha é que foi encontrado quartzo na região, mineral que surge do granito.


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